quarta-feira, 15 de abril de 2020

Primeira carta ou Carta de apresentação

Isso vai pro meu livro?

Acredito que todos já se perguntaram o que iriam fazer, caso suas aflições tivessem um fim. Em alguns casos essas aflições se resumem em morar e comer, com todas as delicadezas que isso evoca. Começo dizendo que já me perguntei! 

Minha vontade mesmo era perguntar o outro, pois eu não sei a resposta e talvez ele e eu possamos encontrar algumas alternativas, nisso que chamamos de sociedade, cidade, bairro, rua, casa, família e por fim não menos importante humanidade.

Comecei a perceber que tudo que sou ou faço é fruto e pede a estrutura capitalista, racista, machista e colonialista do planeta terra, então percebi que havia um problema ali, em mim, onde eu menos queria mexer.

Porém a própria fala denuncia todas as questões do humano. É um caos! Ele se inicia de dia e acaba a noite quando eu não consigo dormir. 

Se a gente descobriu que tudo isso que fazemos é nocivo para o planeta como então acabar com isso? se percebemos que não estamos dando conta de estar juntos o que poderia resolver isso?

Eu não sei e por isso pergunto, pergunto tudo! Perguntar inclusive se tornou minha válvula de escape para não responder, não agir, não morrer.

As palavras não acompanham meus pensamentos, então como posso confiar nelas? Eu queria falar, mas porque eu? 

Voltando ao começo, e se tudo que me aflige acabasse o que eu faria? Eu VIVERIA!

Eu estou viva! Percebo pela maneira que percorre meu corpo a vontade de morrer.

Me permite um explicação possível? Do que adianta sermos capazes de pensar e raciocinar se não damos conta de nossas próprias vidas? estamos enjaulados feito animais, já faz um tempo. 

O isolamento social!

Me dá vontade de rir, ao pensar que diante da impossibilidade de ir e vir, de fazer supostamente nossas vontades, paramos para pensar sobre sociedade e liberdade.

Bom primeiro preciso dizer que sou um pessimista e duvido de qualquer resposta que traga paz, sendo assim continuemos. Agora que todos devem ficar em suas casas começamos a pensar sobre os motivos de sair dela, sobre os motivos de fazer qualquer coisa, hipócritas, é isso que somos.

A nossa (humanidade) unidade está doente e precisa morrer em paz - vontade de rir de novo.

São muitos pensamentos que me ocorrem neste momento de profunda avareza e enorme tristeza, satisfeitos pervertidinhos? De fato não estamos seguindo nosso desejo a um tempo, não estamos pensando sobre a vida já faz alguns milhares de séculos e eu gostaria de saber por qual motivo agora iremos mudar alguma coisa? Está insuportável a muito tempo pra algumas coisas neste planeta, nem ouso chamar de pessoas porque não somos consideradas assim. Minha vontade mesmo era de falar isso tudo, na verdade não falaria nada. 

Não leia este texto se quiser continuar em paz! 

Eu irei destilar do lado de cá meu ódio, raiva e pessimismo somados a ira.  Eles irão decidir do lado de lá, o que será a vida neste planeta. Assim caminhamos ao longo dos séculos de história.
Quem mandou me ensinar a pensar? Quem autorizou me educar e ensinar a ler e escrever esta língua? Pior ainda, quem disse para ler este texto? Quem permitiu a você que se acha na margem do rio ter algum tipo de contato comigo?

Dedico a este ou esta que nos ordena sem permissão todas as expressões possíveis de ódio, raiva e ira. Estou farta de tudo e de todos vocês que nos tratam como coisas, que nos dão respostas insignificantes recebidas por vocês séculos atrás. Acho que somos uma grande ode ao desastre e um exemplo de suicídio cruel e perverso quanto unidade universal. Demorou algum tempo até eu conseguir direcionar a vocês meus sinceros sentimentos, pois essa estrutura invisível consegue se camuflar muito bem por detrás das pessoas, este horrendo jeito de pe(N)sar trouxe para o planeta o assassino homem.

Bom, o que estou tentando mostrar a vocês é que nos tornamos autodestrutivos, o único problema é que para isso destruímos tudo em volta. Tiramos a graça de ver os pássaros voarem, de perceber o tempo mudar, de ver crescer no campo as chamadas crianças. Arrancamos da terra sua alegria sem ao menos nos preocupar com seu orgasmo. Feito piolhos afirmamos nossa existência neste planeta.
Haverá cura após a humanidade passar por aqui? Estaria eu, sendo cruel e radical demais com a raça humana? Será que não podemos aproveitar alguma coisa do capitalismo? Precisamos assumir que ao menos os piolhos nos fazem coçar a cabeça por um motivo real. De fato o que estamos lendo neste momento, através da configuração destas letras, palavras e signos?

Se depois disto eu conseguir um espaço para me cobrir da chuva e vento, um lugar onde eu possa comer e habitar, melhoramos como sociedade, conseguimos andar um passo como humanidade, em volume de mais de sete bilhões de participantes. De modo que já anunciei minha posição quanto a isso, sou pessimista como diz Fernando Pessoa.

Estaríamos prontos para abrir mão de nós? Será que este nosso desejo de vida, consegue viver entre as linhas das regras que oprimem as pessoas? Estaríamos dispostos a ir até onde? Pois acho necessário irmos até o fim do humano.

É bem possível inclusive que outros já tenham dito estas coisas, ou algo semelhante, mas como eu morreram, e não passaram de idealistas e serviram de inspiração para a própria desgraça. Acredito que a essa altura eu deva mencionar a organização do conhecimento em favor de alguns, e até mesmo me organizar para atingir outros.

Este trecho de mim corre o risco de ser mais uma experiência de corpo sem fim, sem lugar, sem vida, quero dizer, um pedaço de mim que servirá apenas como diário póstumo. Mesmo com sua publicação e leitura, ele corre risco de morte.

Assim vamos em direção ao que deveria nos interessar também, de certo modo por pacto cultural, elegemos alguém para decidir como as grandes coisas irão operar. Aqui começa o raciocínio lógico, por qual motivo criamos a unidade exterior quando já havia uma particularidade interior? O que nos levou em direção de grandes unidades ao invés de pequenas diferenças? O que nos fez querer grandes máquinas combatentes ao invés de pequenas soluções harmônicas? Quem nos soprou aos ouvidos que unir todas as  necessidades seria o melhor caminho para resolvê-las? Por qual motivo criamos um mundo, e o conceituamos como único até mesmo para seus habitantes? De onde vem esse imperativo de união?

Agora partimos ao meio e vamos pensar em outra coisa.
Existiria uma única solução? Se ela for exatamente assim, servirá a todes?
Dessa maneira começamos a sentir de novo.

Ao passo que tento dar conta de minha experiência encontro com outra experiência, que não me pertence, logo não posso nem chamá-la de experiência. Desse modo volto ao meu corpo e pergunto o que sentes?

Se eu conseguir comer após esta escrita estarei com certeza satisfeita, inclusive se este texto, papel, celular fosse comestível seria mais útil ao meu corpo e sua fome do que as ideias. De modo algum quero menosprezar este campo de conhecimento e esta parte “invisível” do corpo, quero apenas exaltar sua existência natural e orgânica, harmoniosa com outras formas de vida. (fui sarcástico).

Às vezes essa parte imperativa me coloca em sérios problemas com as partes operativas de sua grande engenhosidade. Isso começou a me despertar. Infelizmente aprendi a perguntar, inclusive o que é uma pergunta? Qual sua estrutura? De onde ela vem? Pra onde ela me leva? Ela mata a fome? Ela consegue evitar assassinatos? Será que ela sabe, que se ela mesmo responde outra pergunta se tornará uma assassina? Enfim: Eu não sei responder - disse a pergunta consciente.

 Agora voltemos aos assuntos mais urgentes para o planeta, essa grande unidade preocupada em sobreviver. Um vírus. Pandemia. Tudo parado. As pessoas “isoladas”, em contato por meio da tecnologia horrenda, que deus nos salve. Várias reflexões sobre o pós pandemia do planeta. O que vou fazer? Continuar lutando por comida, casa, luz elétrica (que hoje se faz importante), água potável ( que está em falta no planeta) e para conseguir continuar ajudando aos meus. Digo viva, porque morta não ajudo muito a apaziguar as brigas lá de casa.
Desse modo procuro manter a calma e a boa convivência com os corpos diante do meu corpo, pois eu não sou o planeta com um vírus ameaçando seu fim, não sou um fajuto presidente e nem votei nele, não sou ministro e muito menos representante de alguém, sou apenas um corpo querendo viver. Infelizmente não tenho uma grande propriedade para colocar a disposição dos que não tem onde morar, não tenho dinheiro para ajudar os pobres, não sou dono ou dona de fábricas e comércios para construir uma forma de partilhar a comida. Eu não posso parar a polícia, não posso mudar a lei, não consigo salvar uma vida e nem sei construir uma casa. Escolhi ser artista, eu apenas danço, às vezes penso e sempre pergunto.

Não tenho poder nenhum diante de muitas pessoas, talvez eu consiga contribuir para a vida de uma ou duas pessoas e mais talvez ainda me defender de uma. Em breve devo morrer, pois essa ideia foi produzida para ser destruída. Ela nasceu e assim morrerá, o que eu acho ótimo! Não, isso não é uma ameaça de morte, logo não serei assassino.

 Concluindo, gostaria de enfatizar que meu pessimismo vem de uma sociedade individualista, que procura se realizar nas coisas que constrói como se este fosse seu fim. Meu desanimo vem das poucas formas que este sistema permite sua refutação. Minhas palavras vem após ver sangrar os olhos das pessoas que sentem o mundo diferente, mas que são mortas antes de atingi-lo.

Este texto nasce na tentativa de conter mais um suicídio neste patriarcado machista, perverso, cruel e assassino de outras formas de vida que lhe escapa a compreensão ou percepção. Este momento vem com boas oportunidades, inclusive a de  destruir tudo. Minha maldade nasce como resposta a impossibilidade de outra realidade. Estas despedidas são para aqueles que insistem em me entender. Essas perguntas são para citações invertidas e divertidas. Este não é um manual e nem a bíblia com todas as repostas, ou seja, o gabarito das questões existências. Esta publicação é uma maneira de romper a suposta barreira.

Queria dizer apenas do meu lugar que muitos não podem e outros não conseguem ver e com a idade que tenho não deveria me manifestar dessa forma, preciso tentar diferente primeiro. Alguns dizem que sou nova e muita coisa irá mudar, que não devo parar de tentar e lutar por um mundo melhor, pelo meu desejo e felicidade, sim são muitas coisas! Mas acontece que ao me perceber em desvantagem por um sistema que valoriza sempre os mesmos e que inclusive exclui os que não o suportam, eu quero PARAR! Não sou herói de planeta nenhum, não sou jesus cristo, muito menos um monge para ficar em busca de coisas fora do sistema. O famoso cis-tema!

Enfim, sou alguma coisa que não cabe, que não pode ser lida, que não oferece mais lucro. Essa ideia de continuar tentando até a morte já foi superada, então já posso parar? Eu gostaria muito de experimentar coisas neste planeta junto a minha espécie, ver as coisas que estão em outro lugar, queria conseguir me entregar para as sensações entre o corpo e o espaço à sua volta. Queria sonhar um sonho meu, sem classe, raça, sexo, gênero e outros marcadores que me oferecem, ou enfiaram goela abaixo. Sabe aquela coisa de sonhar com outra realidade e não uma realidade do outro, então eu queria experimentar isso.

Aqui já estou perdida entre o que me permitiram sonhar e aquilo que eu desejo sonhar de fato e isso não é importante pro planeta, mundo, pro grande outro.
Final! 

Dianna Souza, Belo Horizonte, 16 de abril de 2020.

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